STF julga se Lei dos Planos de Saúde se aplica a contratos anteriores à sua vigência
O Supremo Tribunal Federal (STF) obteve 9 votos a favor para fixar o entendimento que a Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656 / 1998) não se aplica aos contratos firmados antes de sua entrada em vigor. O processo é julgado no plenário virtual e termina na próxima segunda-feira (19/10).
O tema é julgado no Recurso Extraordinário (RE) 948.634, que envolve a Unimed Porto Alegre, e há divergência parcial apenas quanto ao caso concreto, se o recurso da empresa deve ou não ser provido.
A tese proposta pelo ministro relator Ricardo Lewandowski foi aceita por todos os ministros que já votaram: “As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados”.
O caso começou em 2009, quando uma mulher ajuizou uma ação contra a Unimed Porto Alegre, alegando a abusividade do aumento de mensalidade de seu plano de saúde e o desrespeito à Lei dos Planos de Saúde. O plano foi contratado em 1995, mas quando ela completou 60 anos em março de 2009, o plano foi reajustado, e passou de R$ 326,56 para R$ 653,13, representando um acréscimo de 100%. Além disso, a mulher, que foi diagnosticada com câncer de esôfago, teve alguns procedimentos para o tratamento da doença negados pelo plano.
Em primeira instância, a paciente saiu vitoriosa, e a Justiça declarou nulas tanto o aumento quanto as cláusulas restritivas e limitativas de cobertura, e condenou a Unimed Porto Alegre ao pagamento de R$ 4 mil de danos morais. A empresa interpôs recurso de apelação e o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) negou provimento ao recurso. Em seguida, a Unimed recorreu ao STF por meio de recurso extraordinário. Em 2016, este caso causou ampla repercussão, o que faz com que a tese vire de repercussão geral, e seguida por todo Judiciário.
O relator, ministro Ricardo Lewandowski, votou por dar provimento ao recurso da Unimed Porto Alegre, entendendo que a Constituição veda a retroatividade das leis, respeitando o ato jurídico anterior. “A blindagem constitucional ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada configura cláusula pétrea de nosso Texto Magno, e um dos pilares de sustentação do Estado Democrático de Direito, o que os torna garantias individuais de todos os cidadãos”.
Para Lewandowski, “as relações jurídicas livremente pactuadas, com o uso da autonomia da vontade, devem dar valor à segurança jurídica, conferindo-se estabilidade aos direitos subjetivos e, mais ainda, conhecimento inequívoco das regras às quais todos estão vinculados, bem como a tão importante previsibilidade das consequências de suas respectivas condutas”.
O ministro elenca precedentes do STF no sentido de que a Lei dos Planos de Saúde não poderia exigir que as operadoras adaptassem os contratos firmados anteriormente às novas exigências legais, naquilo que dizia respeito à cobertura mínima, bem como em relação a outras condições contratuais.
O relator lembra ainda que a própria Lei dos Planos de Saúde assegurou aos beneficiários dos contratos celebrados anteriormente a 10 de janeiro de 1999 – data da entrada em vigor da nova lei – a possibilidade de aplicação dos novos ditames, por meio de mudança contratual. Mas, os que o fizeram, permaneceram vinculados aos termos da contratação originária, mantidos o valor da mensalidade que antes havia sido ajustado e as mesmas limitações e exclusões pactuadas no contrato original.
“Sendo assim, por melhor que seja a intenção, não tenho como fugir à conclusão de que os fatos nascidos sob a égide da legislação anterior à Lei 9.656/1998, quando ocorrida a pactuação, estão selados como atos jurídicos perfeitos, de modo que o exame de cláusulas contratuais estipuladas entre as partes, os termos da apólice, cobertura e suas exclusões não devem submeter-se à legislação posterior a ponto de torná-los inócuos ou desvirtuar seu propósito”, afirma o ministro.
O relator foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio Mello, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.
Já o ministro Edson Fachin abriu divergência. Fachin acompanha a tese do relator, mas entende que o recurso da Unimed não deve ser provido por entender que havia cláusulas abusivas no contrato em discussão, que afrontariam não a Lei dos Planos de Saúde, mas o Código de Defesa do Consumidor.
“O caso em exame, porém, como revela o acórdão recorrido, encontra-se regido pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Lei n.º 8.078/1990, que veda cláusulas abusivas. Neste sentido, acolhendo as razões do parecer da d. Procuradoria-Geral da República, entendo que não é caso de ofensa a ato jurídico perfeito por meio da retroatividade de lei, já que foram respeitadas as mencionadas garantias constitucionais na avença firmada entre a parte recorrente e a segurada”, argumenta Fachin.
A divergência foi acompanhada pelos ministros Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso. Assim, há nove votos pela tese, mas seis pelo provimento do RE da Unimed Porto Alegre. O ministro Luiz Fux não participou do julgamento.
Texto de autoria da estagiária de Direito Beatriz Bezerra, com a supervisão da sócia-advogada Nathalia Pedrosa.
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