Cláusula de Quarentena nos Contratos de Trabalho
Atualmente, diante dos avanços tecnológicos, da globalização e ainda com a finalidade de proteger seu patrimônio, uma vez que a Constituição Federal garante a livre concorrência . . .
Com base na cláusula de quarentena, o funcionário assume a obrigação de não praticar, após a rescisão de seu contrato de trabalho, ações que possam implicar em desvantagens e concorrência com o antigo empregador.
Entretanto, até o presente momento não há qualquer disposição legal específica acerca do tema, razão pela qual se faz necessária a análise de princípios e legislação correlata, bem como o estudo da doutrina e jurisprudência para fundamentar sua inclusão nos contratos de trabalho atuais.
De acordo com Sérgio Pinto Martins, a cláusula de não concorrência “envolve a obrigação pela qual o empregado se compromete a não praticar pessoalmente ou por meio de terceiro ato de concorrência para o empregador”¹.
Nota-se que o dever de fidelidade ou não concorrência é inerente ao contrato de trabalho, tanto que as alíneas “c” e “g” do artigo 482 da CLT, dispõem que a negociação habitual e a violação do segredo de empresa são hipóteses de falta grave que autorizam a dispensa por justa causa do empregado.
Observa ainda que o princípio da boa-fé disposto no art. 422 do Código Civil impõe aos contratantes uma conduta de acordo com os ideais de retidão de caráter, honestidade e lealdade, independentemente da vontade subjetiva do agente, não só na formação, mas também no desenvolvimento e conclusão de qualquer contrato (aqui incluído o de emprego).
Dessa forma, pautando-se nos dispositivos citados, verifica-se atualmente a validade da inserção da cláusula de quarentena nos contratos de trabalho, desde que atendidos alguns requisitos.
Por outro lado, há entendimento minoritário de que a pactuação de cláusula contratual prevendo a não concorrência após a extinção do contrato de trabalho, ofende o princípio do livre acesso ao trabalho previsto no inciso XIII do artigo 5º da Constituição Federal, não obstante, a posição majoritária em nossos Tribunais é no sentido contrário, na medida em que inexiste direito absoluto, pois ao lado do direito de o trabalhador dispor de sua força de trabalho como bem entender, o empregador tem o direito de resguardar sua propriedade, os seus produtos, os seus inventos.
Nesse sentido, Ari Possidônio Beltran:
“(…) tal dispositivo (inciso XIII do artigo 5º da Constituição Federal), como qualquer outro, deve ser entendido em harmonia com os demais preceitos, e não isoladamente. Ademais, a abstenção deverá ser temporária, estabelecida por consenso e mediante justa contraprestação de caráter indenizatório, devidamente acertada entre as partes. Deverá ser limitada no tempo e abrangerá apenas a atividade fixada, especificamente, como capaz de, em tese, colocar em desvantagem o antigo empregador frente a concorrentes. Estará o empregado livre para o exercício de quaisquer atividades não constantes da limitação, ou seja, a vedação atinge – e não gratuitamente – apenas o “não concorrer”, durante certo tempo. Em suma, pactua-se uma „espera remunerada”²
Com efeito, ressalta-se que de acordo com o artigo 444 da CLT, “as relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes”.
E ainda que, embora não haja disposição legal acerca do tema, da mesma forma não há em nosso ordenamento jurídico, qualquer proibição de pactuação de cláusula de não concorrência após o término do contrato de trabalho, sendo que o artigo 122 do Código Civil preceitua serem lícitas todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes.
* Limitação no tempo;
* Restrição relacionada com a atividade profissional exercida pelo empregado;
* Limitação geográfica;
* Compensação financeira pela restrição laboral;
* Fixação de multa em caso de descumprimento por ambas as partes.
Quanto à restrição da atividade profissional deve estar “relacionada com a atividade profissional exercida pelo empregado na vigência do contrato individual de trabalho. É imperioso que a cláusula explicite todas as restrições, indicando o campo de atuação e as respectivas limitações, com detalhes técnicos específicos. Em hipótese alguma, a restrição poderá vedar qualquer atividade por parte do ex-empregado (a cláusula da não-concorrência teria a configuração de uma cláusula abusiva)”.
Sendo ainda formulada mediante acordo, após o término do contrato de trabalho, para que não se torne “condição leonina”, vale dizer, a sua implementação não ser concentrada na vontade e poder de uma só das partes, discutem os doutrinadores e divergem os juízes acerca do quanto é devido a título de ndenização, para alguns ela deve corresponder à integral recomposição da subsistência profissional, diante dessa paralisação “forçada”, para outros deverá ser fixado valor no mínimo equivalente a 30% do que o ex-funcionário perceberia se estivesse laborando. Diverge-se ainda quanto a limitação temporal da quarentena, que varia de 6 meses a 2 anos de duração.
Consoante ensinamentos de Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante:
“Essa compensação, no mínimo, deverá corresponder à remuneração por ele auferida quando estava em vigência o contrato individual de trabalho. Por remuneração, a nosso ver, compreendem-se as vantagens pecuniárias e não-pecuniárias (vantagens in natura), decorrentes não só da prestação de serviços, como do contrato de trabalho, pagas pelo empregador. Vale dizer, a indenização pela restrição advinda da proibição representado pela não-concorrência, equivalerá, no mínimo, ao que ex-empregado receberia se estivesse na condição de empregado. Trata-se de valores de natureza indenizatória e não salarial, por não prestação de trabalho, (sic) não remunerando o trabalho prestado ou o tempo à disposição. A indenização será equivalente ao valor da última remuneração mensal, multiplicada pelo número de meses relativos à duração da não-concorrência. O pagamento poderá ser mensal ou no ato da dispensa”.
Entretanto, conforme ressaltado acima, em vista da ausência de previsão legal específica, não há uma definição do quanto é devido a título de indenização pelo período de quarentena.
Corroborando o quanto exposto, verifica-se a jurisprudência atual dominante, inclusive do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, senão vejamos:
– CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA. VALIDADE. É válida a inserção de cláusula de não concorrência no contrato de trabalho, desde que restrita a determinado segmento de mercado e estabelecida por tempo razoável, além de prever indenização compensatória. Não há que se falar em alteração contratual lesiva (CLT, art. 468) na medida em que as normas contratuais decorreram de mútuo consentimento e não acarretaram prejuízo ao Reclamante, observando os princípios e normas legais. Referida cláusula tem como justo objetivo proteger segredos industriais entre empresas concorrentes, procurando evitar a quebra de sigilo. Na verdade, tal dispositivo contratual visa preservar os princípios da lealdade e da boa-fé (art. 422 do Código Civil), inexistindo mácula a respaldar a pretendida nulidade. (TRT 02ª Região, AC. 20071056976, Relator: SERGIO WINNIK, DOE: 14/12/2007)
– CLÁUSULA DE NÃO-CONCORRÊNCIA – RESTRIÇÃO TEMPORÁRIA E PARCIAL AO EXERCÍ- CIO PROFISSIONAL – OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA RECÍPROCA ENQUANTO PERDURAR A LIMITAÇÃO. A estipulação de cláusula contratual de não-concorrência por determinado período após o término da avença impõe ao contratado restrição ao exercício profissional relativamente a determinados clientes, quais sejam, aqueles vinculados ao próprio escritório de advocacia. Em consequência, a compensação econômica convencionada para a hipótese de eventual descumprimento da cláusula em questão por parte do contratado também deve ser aplicada em seu benefício, enquanto perdurar a obrigação de não-concorrência, em observância aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da comutatividade dos contratos. Recurso ordinário parcialmente provido. (TRT 15º Região, AC.00159/2010, Relator: Fernando da Silva Borge, DOE: 15/01/2010)
– DANO MATERIAL. ACORDO FIRMADO ENTRE AS PARTES. QUARENTENA. O acordo espontaneamente firmado pelo reclamante não o impediu de exercer sua profissão em empresas de ramo distinto da empregadora, sendo que o autor, diretor financeiro e comercial, não dependia das empresas congêneres da reclamada para exercer seu ofício. De outro lado, consoante reconhecido pela Corte de origem, o reclamante não era obrigado a aceitar o ajuste e não houve prova nos autos demonstrando que o obreiro, no período do impedimento, veio a sofrer algum prejuízo com o pacto da quarentena. Em tais circunstâncias, não se cogita em afronta ao princípio do livre exercí- cio da profissão. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST, AIRR – 2632600- 54.2002.5.02.0902, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, 1ª Turma, DEJT 06/08/2010).
Assim, em que pese a ausência de previsão legal específica em nosso ordenamento jurídico, a cláusula de não concorrência (Quarentena) tem respaldo legal em sentido amplo, razão pela qual é possível estabelecê-la em contrato de trabalho, mediante consenso entre as partes contratantes, por prazo de vigência determinado, limitada à atividade profissional exercida pelo empregado na vigência do contrato de trabalho, fixado seu alcance geográfico e multa no caso do não cumprimento pelas partes contratantes, além do pagamento de razoável compensação financeira ao empregado, repousando seu fundamento na garantia de que a empresa não fique exposta a uma possível concorrência desleal e à quebra de sigilo de seu ex-empregado.
Ana Paula de Oliveira Papa
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Categoria: Rodrigo Alberto Correia da Silva, TRABALHISTA CONSULTIVO E CONTENCIOSO
Tags: correia dasilva advogados, csa, trabalhista, trabalhista consultivo, trabalhista contenciosoPostado em: 31/05/2011